Uma sondagem dos discursos jornalísticos na cobertura da visitante cubana Yoani Sánchez
Yoani atendeu toda a mídia nacional. Foto: Dado Galvão |
Yoani
Sánchez, a blogueira que já foi
premiada diversas vezes por seus artigos e suas críticas sobre a situação
social em Cuba sob o governo de Fidel Castro e de seu irmão e sucessor, Raúl
Castro, esteve no Brasil, em fevereiro, e, desde sua chegada ao país, enfrentou
manifestações ruidosas de uma dezena de simpatizantes do regime castrista, e
vários contratempos em seus eventos, e ganhou destaque na impressa brasileira.
Yoani ficou conhecida internacionalmente pelo blog
“Generación Y”, em língua portuguesa “Geração Y”, fundado em 2007.
Queremos saber de Cuba
A
emissora de televisão pública, Cultura, em relação à Yoani Sánchez, expressou a
ideia de saber ainda mais a respeito da ditadura que rege Cuba, através de uma
própria habitante do país, para falar do que precisa mudar na sociedade cubana,
do modelo castrista de governar, de que modo vivem os cubanos – em relação à
saúde, educação, oportunidade de vida. E sobre a blogueira, as perguntas
ressaltaram a vontade de descobrir a ideologia defendida por ela – como as realizadas
no começo do programa Roda Viva, programa de entrevistas tradicional da
emissora, qual Yoani foi a entrevistada. Resultaram na popularização dos pontos
de vista de Yoani que, em todas as respostas, ela deixou claro o seu dever em
levar a liberdade de expressão aos seus conterrâneos.
Entre o governo e Yoani
Foto: Dado Galvão |
Na
cobertura jornalística da Rede Globo, sobre a visita da blogueira, foi
destacado que Yoani ficou conhecida por denunciar os abusos da ditadura dos irmãos Castro. É notório que a TV Globo mantém um vínculo
com o atual governo brasileiro, que possui uma relação especial com o governo
cubano. Ao analisar a história da rede Globo, pode-se levar em conta que ela
possui vínculos governamentais. Assim, ela não fará o que comprometerá seus princípios.
Apresentou a imagem de Yoani sempre como blogueira, ativista de
oposição do regime e “popstar”, e não
como jornalista e filóloga, que são suas profissões em Cuba. A emissora transmitiu
como prioridade as manifestações e os protestos que ocorreram por onde ela
passava, mostrando aos telespectadores a imagem de uma visita polêmica, talvez
desnecessária, quando a principal causa era a estreia do documentário de que
participou “Conexão Cuba-Honduras” e lançamento
do livro “De Cuba, com carinho”. Essas informações foram veiculadas, mas não
com tanta ênfase quanto os protestos, deixando no ar a ideia de que o Brasil é
um país que é contra o comunismo de Cuba.
Analisando
a cobertura jornalística produzida pelo jornal Folha de S. Paulo, no período de
visita da blogueira e dissidente cubana Yoani Sanchez, pode-se perceber que, sem
dúvida, o foco do jornal foram as manifestações realizadas contra Yoani,
atribuídas aos partidos políticos brasileiros PT e PC do B. A cobertura que, por
quatro vezes focou nos protestos, empobreceu o discurso jornalístico, que
poderia ter se preocupado mais com o que Yoani tinha a dizer e não foi dito,
por exemplo, do que falar unicamente dos protestos; não que esses eventos não
tivessem importância. A questão é que toda a produção jornalística da Folha,
durante a semana de cobertura, girou em torno de uma temática só: os protestos.
Quanto a isso, é conclusivo que houve uma lacuna na cobertura jornalística
sobre a passagem de Yoani Sánchez pelo Brasil, produzida pela Folha de S.
Paulo.
Já o jornal Estado de S. Paulo é conhecido por seu conservadorismo
e, mesmo sendo o jornal que mais deu voz à ativista, ainda assim não foi o
bastante. As manifestações ofuscaram o principal objetivo de Yoani Sánchez no
Brasil: divulgar sua cultura e seu trabalho.
Ela foi impedida de realizar uma tarde de autógrafos na
livraria Cultura, em São Paulo. Além da exibição do documentário Conexão
Cuba-Honduras, que teve que ser cancelado devido a mais manifestações, foram
inúmeras delas que a acompanhou nos aeroportos em que Sánchez desembarcou. A
ativista saiu de seu país depois de ser impedida mais de 20 vezes, para falar e
transmitir conhecimento. Porém, o que encontrou aqui foram mais e mais pessoas
tentando calar a sua voz e, assim, ocupando um espaço que deveria ser dela, que
deveria ser de voz.
Nas
matérias publicadas durante a semana em que a blogueira ficou no Brasil, o
Portal Terra divulgou toda a agenda de Yoani, e relatou esses eventos sempre
superficialmente, narrando apenas como foi recepção da cubana, o que ela achou
do lugar e dos protestos – que estavam presentes em quase todos os eventos.
Também foi relatado os próximos países que Yoani visitaria, o prêmio de
direitos humanos que ela receberia no EUA. A série de matérias termina com a
foto de Yoani tomando água de coco com o título: “Após uma semana, Yoani deixa
o Brasil em clima de paz”.
A
imagem que fica dessa cobertura é a de que, mesmo dando ênfase às profissões de
Yoani – filóloga, jornalista e blogueira -, o portal construiu a imagem da
visitante como uma popstar que tentou por diversas vezes sair do seu país, e
que estava “passeando” no Brasil, visto que, nas inúmeras matérias publicadas,
não se falou sobre o que ela veio fazer no país, quais eram suas intenções;
ficando apenas conhecida como a superficial “ativista
defensora da democracia”.
O
portal R7 mostra ser contra a ditadura cubana, ao focar nas manifestações
contra Yoani Sánchez e, em quase todas as matérias, resaltar as várias
tentativas ‘frustradas’ não só da jornalista, mas de muitos outros ativistas,
de sair de Cuba e, ainda, falar sobre a falta de liberdade de expressão e a
reforma migratória no país comunista.
O
portal também classifica o blog “Generación Y” de Yoani Sánchez como muito
elogiado em todo mundo e, ainda, ressalta que a dissidente cubana foi eleita
como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo, pela revista Time e que seu
blog foi eleito, pela rede de TV CNN, um dos 25 melhores do planeta.
Com
todas essas classificações, o R7 passa uma imagem de que a cubana é a pessoa
prejudicada em toda a história; reforça isso quando fala sobre o dossiê, contra
Yoani, implantado no Brasil pelo embaixador de Cuba no país. O documento teria
sido distribuído, principalmente, entre funcionários do PT. O portal deu voz à
cubana, que considerou o documento como uma “violação” a sua liberdade de
expressão e que as manifestações foram um ato de “fanatismo repressivo”.
Foto: Dado Galvão |
O discurso da revista Época não focou apenas as
manifestações e os protestos. Yoani teve uma voz ativa no veículo, e, da mesma
forma, cheio de construções ideológicas. De modo que não a comprometesse, a Época
mostrou desde investigações sobre uma
influência direta do regime cubano na organização dos protestos até um simples
puxão de cabelo que a cubana levou.
Porém, ao
terminar, as últimas perguntas são sobre um assunto mais leve, o que sugere uma
sutileza estratégica que objetiva fechar o assunto pacificamente, assunto este
que trata sobre sua vaidade e seus cuidados com os longos fios de cabelos.
A
revista semanal Veja levantou uma bandeira abertamente e sem medo de se
posicionar. Com o título “A Guerreira e os Fanfarrões” o veículo defendeu uma
Yoani Sánchez heroína e vítima da brutalidade dos manifestantes esquerdistas dos
partidos PT (Partido dos Trabalhadores) e do PCdoB (Partido Comunista do
Brasil).
Utilizando-se
de um leque de mecanismos argumentativos, a reportagem principal da edição
posicionou-se contra as manifestações em oposição a Yoani; em um ataque velado,
sobretudo, ao PT. É explícito, na análise do discurso de Veja, que o alvo de
suas publicações é, impreterivelmente, o Partido dos Trabalhadores. É lúcido
afirmar então, sob esse prisma, que Yoani para Veja é, definitivamente, a
heroína construída na ponta do lápis do chargista de Veja; observa-se na arte
da capa que Yoani ameaça o governo da família Castro, tragicamente representado
pela figura de um elefante, com a simplicidade de um mouse [figura
representativa da inovação tecnológica, o Blog Generación Y, responsável pela
última revolução de expressão de Cuba].
Se
Yoani teve sua figura construída para atender aos desejos editoriais da revista
paulista, é claro que os anseios, objetivos, como do próprio motivo de visita
da blogueira ao Brasil, não foram propagados. O que vimos foi um ataque direto
aos manifestantes do PT, possivelmente orientados pelo governo de Cuba.
Reportagem essa que deu gancho a outra matéria que revelava possíveis
escândalos denunciados por Veja na mesma edição; uma sequência inteligente e
extremamente persuasiva.
É
uma das correntes de nossa investigação a manipulação velada dos veículos de
comunicação sobre Yoani Sánchez. Em nenhum dos veículos Yoani foi o centro. A
personagem central ora era colocada à esquerda, ora à direita; o desejo da
blogueira não foi alcançado. A mensagem simplesmente não teve receptor. O
interlocutor foi censurado pelo intermediário: a imprensa. O que Yoani tinha
para dizer? Ninguém sabe. Suas palavras foram abafadas pela gritaria dos
manifestantes. Seria, todavia, gritaria esta tão alta que um microfone tão
poderia superar? Uma mão habilidosa desviou o holofote de Sánchez para a
multidão; e o microfone, esse foi desligado para que o barulho conveniente
tapasse a boca da visitante cubana.
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